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Reduzir a Jornada de Trabalho: Uma História de Direitos, Contradições e Reflexões Sobre a Vida

O impacto das jornadas exaustivas, as mudanças históricas na CLT e a busca por equilíbrio entre produtividade e direitos no Brasil.

Por Paulo Marcelo em 18/11/2024 às 18:43:00

O debate sobre a jornada de trabalho é um tema histórico, que atravessa gerações e reflete a busca pelo equilíbrio entre produtividade, direitos e qualidade de vida. No Brasil, essa discussão ganhou força novamente com a insatisfação de trabalhadores submetidos à escala 6x1, que permite apenas um dia de folga por semana.

O balconista de farmácia Rique Azevedo trouxe essa pauta à tona em 2023, ao publicar um vídeo no TikTok criticando as condições de trabalho. O desabafo viralizou, deu origem ao movimento Vida Além do Trabalho (VAT) e levou o tema ao Congresso Nacional. Entre polêmicas e resistências, o debate atual reflete tanto os desafios históricos quanto a possibilidade de um futuro mais humano.

Criada em 1943 pelo presidente Getúlio Vargas, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) foi um marco na formalização das relações trabalhistas. Ela estabeleceu uma jornada semanal de 48 horas, além de direitos como carteira assinada, férias remuneradas e proteção contra demissões arbitrárias.

Apesar de sua importância, a CLT enfrentou críticas de empregadores preocupados com custos e de trabalhadores temerosos de perder seus empregos. Essas tensões mostram que qualquer mudança trabalhista é acompanhada por contradições, mas é essencial para o progresso social.

Em 1988, a nova Constituição representou um salto qualitativo para os trabalhadores:

  • Reduziu a jornada semanal para 44 horas, sem redução salarial.
  • Estabeleceu direitos como licença-maternidade e paternidade.
  • Instituiu a multa de 40% sobre o FGTS em demissões sem justa causa.

Essas mudanças consolidaram a visão de que trabalho é um direito social, mas enfrentaram debates sobre custos e impacto no mercado.

A promulgação da PEC das Domésticas em 2013 garantiu direitos como carteira assinada, FGTS e pagamento de horas extras para trabalhadores domésticos, corrigindo uma injustiça histórica. Apesar de seu impacto positivo, a medida foi recebida com resistência de empregadores e dúvidas sobre sua viabilidade.

Esse marco evidenciou que mudanças trabalhistas não afetam apenas a economia, mas também a dignidade e a inclusão social.

Na gestão de Michel Temer, a CLT sofreu sua maior revisão desde a sua criação. Entre as mudanças introduzidas, destacam-se:

  • Prevalência do negociado sobre o legislado: Permitiu que acordos coletivos prevaleçam sobre a legislação em temas como jornadas e intervalos.
  • Trabalho intermitente: Formalizou contratos em que o trabalhador é pago por hora trabalhada, sem garantia de jornada mínima.
  • Enfraquecimento dos sindicatos: A contribuição sindical deixou de ser obrigatória, reduzindo a receita e o poder de negociação dessas entidades.

Embora defendidas como uma forma de modernizar o mercado de trabalho, essas mudanças foram amplamente criticadas por enfraquecerem direitos trabalhistas e aumentarem a precarização.

Em 2023, o balconista Rique Azevedo viralizou ao denunciar as dificuldades enfrentadas por trabalhadores submetidos à escala 6x1. Seu movimento, o Vida Além do Trabalho (VAT), propõe uma revisão dessa escala, buscando mais equilíbrio entre trabalho e vida pessoal.

A atual é considerada exaustiva e desumana por muitos trabalhadores. Inspirada por experiências internacionais, a pauta reflete o desejo crescente por qualidade de vida e maior convivência familiar.

Alguns países já implementaram jornadas mais curtas ou modelos flexíveis:

  • Islândia: Testes com semanas de 36 horas mostraram aumento na produtividade e melhora no bem-estar dos trabalhadores.
  • Portugal: Algumas empresas adotaram semanas de quatro dias, com bons resultados em produtividade.
  • Japão: A Microsoft testou semanas de quatro dias e registrou aumento de 40% na produtividade.

Por outro lado, a escala 6x1 ainda é amplamente adotada em países com economias emergentes, especialmente em setores como comércio e indústria.

Embora jornadas mais curtas tragam benefícios comprovados, a proposta enfrenta resistências:

  • Empresários: Alegam que mudanças podem aumentar custos operacionais, principalmente para pequenas empresas, que têm menos recursos para contratar novos funcionários.
  • Trabalhadores: Parte da classe trabalhadora teme perder empregos, mostrando como o receio do desemprego influencia a resistência a mudanças.

Essas tensões não são novas e refletem as dificuldades históricas de equilibrar produtividade, direitos e sustentabilidade econômica.

Enquanto empresários criticam os custos de mudanças, muitos desfrutam de condições de trabalho privilegiadas, com mais tempo para a família e recursos para cuidar da saúde. Já o trabalhador comum, especialmente em escalas como a 6x1, muitas vezes sacrifica:

  • Convivência familiar: Perdendo momentos importantes com os filhos.
  • Saúde física e mental: Com altos índices de burnout e doenças relacionadas ao estresse.
  • Desenvolvimento intelectual e ócio criativo: Sem tempo para investir em estudos ou hobbies.

Como afirmou Karl Marx, "o tempo livre é a base do desenvolvimento humano." A geração Y, que valoriza equilíbrio e bem-estar, destaca a importância de repensar jornadas exaustivas, que não permitem ao trabalhador viver plenamente.

A história das jornadas de trabalho no Brasil é uma narrativa de avanços e contradições. Cada mudança trouxe benefícios, mas também gerou tensões e desafios. Hoje, a discussão sobre a escala 6x1 e a redução da jornada semanal não é apenas uma questão econômica, mas um reflexo de uma sociedade que busca mais tempo para viver, e não apenas para trabalhar.

Com diálogo e planejamento, é possível construir um modelo que beneficie tanto trabalhadores quanto empresas, promovendo um futuro mais justo e equilibrado.

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